sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Arte e Ciência e a Transformação dos Paradigmas

1. O Problema da Pesquisa em Artes


Uma dificuldade inerente a este campo diz respeito a escolha de um método para a pesquisa em artes, o contrário da ciência que tem despertado a atenção e preocupado os pesquisadores desde tempos remotos e tem consolidado ao longo deste caminhar, uma gama de possibilidades de pesquisa.

A partir da constatação da “carência de estudos sobre as questões teóricas da “pesquisa em artes”, seria necessário a busca e confrontação com os métodos e referenciais teóricos elaborados pelos filósofos da ciência. (ZAMBONI,1993).
Para realizar essa aproximação teórica, nos referiremos ao pensador Thomas Kuhn e as idéias que desenvolveu para a ciência a partir do livro A estrutura das revoluções científicas.

Para Kuhn, a ciência vive em torno da sucessão de paradigmas, conjunto de teorias que coexistem entre si e não se contradizem. Esse conjunto teórico e construído na heterogeneidade dos eventos, dos quadros, sucessivos e fragmentados, e não em uma harmonia linear e cronológica dos conhecimentos. Vão ser esses conjuntos de teorias e conceitos que formarão os paradigmas.

Em outro ponto, Kuhn refere-se a situações em que pode ocorrer mudanças de paradigmas, tipificando dois momentos para a ciência: a “ciência normal” e a “revolução científica”. Para este autor, esses dois períodos diferenciam-se mais por questões de magnitude, e “não de diferenciação com relação à criatividade nos processos de produção científica”. Nas “revoluções cientificas” é necessário um impulso criativo maior para o rompimento dos paradigmas. Por outro lado, existem épocas de maior estabilidade, de coerência teórica, a que Kuhn denomina de “ciência normal”, e são esses cientistas os responsáveis pela solução do “quebra-cabeças”. Esse período se caracteriza por uma estabilidade científica e poucas novidades surgem.

O que se costuma referir como a “crise dos paradigmas” parece-me fruto da própria lógica da ciência onde os paradigmas não se sustentam eternamente, e a crise se dá exatamente no tempo em que há um esgotamento e uma necessidade de novos paradigmas.
Segundo Zamboni “Uma pesquisa que aponte um caminho que possa contradizer um paradigma terá, num primeiro momento fortes reações da comunidade científica, que está acostumada a trabalhar e a raciocinar dentro desses moldes”.(p.30).

Isto é perfeitamente visível nas novas teorias explicativas sobre a origem do homem americano formuladas por Niéde Guidon e sua equipe, a partir das descobertas dos sítios arqueológicos na Serra da Capivara, nos municípios de São Raimundo Nonato, Cel. José Dias e João Costa, no semiárido piauiense.

Portanto,“quando surge um novo paradigma, normalmente instala-se um período de extensa atividade, onde começam a aflorar novas descobertas de relevância, a criatividade se faz necessária de forma intensa, pois novas teorias vão se formando...” (Zamboni, p.29-30,) ao que Kuhn destaca imperativamente que rejeitar um paradigma sem apontar o novo caminho é rejeitar a própria ciência.

2. As rupturas científicas e as rupturas no campo artístico.

Para Kuhn, os ciclos paradigmáticos – “o surgimento” e “rupturas” – na ciência guardam semelhanças com o campo das artes. As formas artísticas são desenvolvidas através de um conjunto de idéias que “delimitam a forma de atuação e produção artística” , e são condicionadas aos paradigmas vigentes. Zamboni aproxima o conceito de “arte normal” ao conceito “ciência normal” de Kuhn, para a “produção artística despida da preocupação de promover grandes rupturas”.(p.32).

Na medida do esgotamento normativo de uma escola, movimento ou conjunto de idéias, atinge-se a crise tal qual nos paradigmas científicos. A diferença, segundo o Zamboni, reside no fato de que na ciência os fatos novos “são pertinentes a uma ou várias teorias compatíveis” e procuram “explicar racionalmente” o novo paradigma. Em arte, as rupturas muitas vezes são resultado de uma experiência “interior e individual para a aceitação”.(p.33).

Outros aspectos ainda são abordados Zamboni com base na teoria de Kuhn, dos quais cito alguns:
• Um paradigma, a ser suplantado por outro, não perde a legitimidade da validade científica. Ele apenas cai em desuso.
• Os cientistas que não se enquadram ao novo paradigma ficam à margem da comunidade científica.
• Na teoria científica de Kuhn, a acumulação do conhecimento faz mais sentido dentro de um mesmo paradigma. Quando ocorre uma mudança de paradigma, é rompida a cadeia que o orientava e conduzia. Portanto, a acumulação de conhecimentos (progresso da ciência) se dá dentro dos paradigmas das respectivas correntes de pensamento.
• A acumulação de conhecimento no campo das artes pode ser exemplificada através de técnicas em evolução onde o artista se baseia em “descobertas” de outros para progredir.

Acredito que essa reflexão possa ser bastante útil para entendermos as transformações e/ou rupturas nos princípios estéticos e nas linguagens musicais através da história da música.

3. Referências

KUHN, Thomas. A estrutura das revoluções científicas. 7.ª ed. São Paulo: Perspectiva, 2003

ZAMBONI, Sílvio. “O Paradigma em arte e ciência”. In: Pesquisa em Artes Plásticas. Analice Dutra Pillar et alli. Porto Alegre, Ed. Universidade/UFRGS/ANPAP, 1993, p.29-38.

Prof. Dr. João Berchmans de Carvalho Sobrinho

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